Porque, meu bem, ninguém é perfeito e a vida é assim

Por Clarissa Dutra


...Concordo plenamente. Todos nós somos seres propícios a escolhas que nem sempre são as mais corretas ou acertadas. Gosto, por exemplo, não se discute. Pode ser perfeito pra mim ou piegas pra você, vice versa. Mas quem dita, meudeusdocéu, o que é a atitude mais correta, o gosto mais acertado? A imperfeição pode ser encarada com criatividade, ousadia, rebeldia, é até sexy – eu acho. Ou não? Não ser perfeito pode ser uma falha!? Não ter o cabelo, o corpo, o namorado(a), o sorriso, a bunda, o carro etc etc etc - mais bonito, é antiquado! A moda é ser bom(a) o tempo todo, toda hora. Perfeição está ligada à estética, assim como o queijo a goiabada e entra tudo junto no mesmo bolo da inteligência e da ascensão pessoal/profissional (tirando o queijo e a goiabada, tá?). Mas calmaê!? Já que não vou falar de política, futebol ou mulher/homem, e pra mim, não vale a pena ficar ditando o que é (im)perfeição ou não,vou falar do BREGA!

Confesso que, abre parênteses, dó ré mi fá só lá si dó não faz diferença alguma e tenor, soprano, falsete, agudo e grave só existem em orquestras, fecha parênteses. Sei também, que no mínimo, é preciso gostar muito de MÚSICA pra se meter a falar de qualquer estilo. (Pééém! Resposta errada!) O brega, que é meu escolhido dessa semana, não toca nunca/jamais no meu ipod, mas – na linha direta de xangô – fica impregnado na minha cabeça. Eu assobio, sabe como é? Gente, Vinicius e Cartola que são minhas paixões não me fazem assobiar. Trato-os com divindade, são intocáveis. Já o brega... Ah! O brega... É pra você pegar, jogar na parede e abusar até a última gota. (Me entendam bem).

Eu poderia começar a falar do começo: Revolução Industrial, industrialização da cultura, arte como mercadoria, cultura de massa, cultura erudita e mimimi. Mas, como embasamentos teóricos costumam ser chatos e pedantes, pularei essa parte e vou logo pra parte boa: a bagaceira. É que, de repente, eu me vi dançando e cantando loucamente. Então, eis que surgem os seguintes questionamentos: o que está acontecendo? Por que o brega está cada vez mais presente no nosso cotidiano e como ele conseguiu sair da margem e ganhar o status de cult? Pois bem, foi vendo um monte de jovens pertencentes às classes A e B no meio de shows de Kelvis Duran, O Conde e Reginaldo Rossi que eu me vi com questionamentos do tipo: "que coisa, né? Esse povo num botava pra lascar nesse tipo de música antigamente?".

Analisando melhor (sem tentar entender), esse fenômeno sociocultural que arrasta esse “novo” público, de uma maneira ou de outra, ME INCLUI. Comoassim? Ééé... Se assobio é porque já impregnou. E se impregnou, bom ou não, é porque algo aí fez a diferença. (O meu diabinho no ombro esquerdo falou que não tem nada haver o que estou dizendo aqui. Que, de fato, eu não gosto de brega e sim, que apenas me influencio pela repetição aleatória e pelo modismo me inserir no contexto social).Tanto faz, tanto faz.

A verdade é que o brega faz parte de mim, de alguma forma, e é ridículo não reconhecê-lo como parte da cultura no qual estou inserida. Se não toca no meu ipod, toca na rádio que vem lá da cozinha, do vizinho do lado, da rua. Toca nas baladas que vou, nas conversas e depois de duas ou três (ou 10 cervejas) já toma conta das minhas pernas e braços e cintura completamente. Há uns quinze dias atrás, por exemplo, disse aos meus pais que estava indo ver um show da Fernanda Takai na Torre Malakoff e, na verdade, estava descendo até o chão, chão chão chão no Motel Sunshine, com a banda Faringes da Paixão! (Ok, eu poderia ter abstraído essa informação). Mas o que estou querendo dizer não é que enganei meus pais ou que Fernanda Takai me dá credibilidade moral, mas que EU ESTAVA ME SUBMETENDO a ir onde Judas perdeu as botas, pra d-a-n-ç-a-r (com todas as letras, porque só foi o que fiz por lá!), o brega. Esse estilo musical que não me dá tesão nas letras, que sua melodia é inteiramente repetitiva, que acho “baixo” e totalmente desnecessário na minha vida. Contraditório, não?

De alguma forma, eu estava (com todo meu amor por Cartola, o homem mais gentil do mundo – diga-se de passagem) envolvida com “Rapariga é você, mal amada, não seja boba, ele não quer te ter...". Sem falar das pérolas românticas: “Se eu tivesse a lua, eu a daria pra você, mas como não tenho nada, eu lhe ofereço um Passe C". E olhe que não entrei na área erótica, porque essa, simplesmente nem pra ri me serve. Brega é pra você se valorizar!? Entrar na academia, malhar, malhar, malhar e não tá nem ai pro resto do mundo!? É o que faremos, então. Por mais subjetivo e contraditório que isso possa parecer.

Confesso que se o Antônio Houaiss conhecesse Vício Louco ou Dejavu – ele mudaria de conceito: BREGA (adj. 1. que o quem não tem finura de maneiras; cafona. 2. de mau gosto, sem refinamento, segundo o ponto de vista de quem o julga 3.de qualidade inferior | Dicionário Houaiss da língua portuguesa). Porque o brega saiu da periferia para se tornar popular entre os jovens de classe média, que antes discriminado e encarado como pejorativo, tornou-se “engraçado” - audível porque é música pra “tirar onda”. Totalmente inserido no nosso contexto social, cotidiano e é atualizadíssimo!

As melodias fortes, letras que falam sobre traição, casamento, desilusões e declarações amorosas, geralmente são levados pro lado humorístico, satirizando o cotidiano ou elevando o duplo-sentido na potência máxima, mas ainda sim é considerado: chic! O brega é pop, é tecno (?) – acredite, já há ramificações inseridas na música eletrônica. E aonde vai parar? Não sei. O ritmo já está inserido na cultura popular dos pernambucanos – é só observar que o brega não toca (apenas) em botequins ou casas “noturnas” em periferias, mas também em festas como I Love cafusú, Sem Loção, Amizade Colorida e lá vão mais outras tantas, produzidas por gente alternativa e descolada, freqüentadas até por boyzinhos e patricinhas – que não estão nem aí pra saber de onde veio ou aonde vai parar.

Se é possível misturar as classes sociais, independente do nível intelectual ou financeiro, e todos convivem em harmonia – deixa rolar o som. O brega é pra conquistar e todo mundo se divertir. E eu, pseudo-intelectualizada, inserida nessa esclerose do poder, de consumo, submergida nessa catarse social e falsa consciência estética, continuo sem acreditar que gosto não se discute (!?). Esperando, porém, acima de tudo, que a gente e a música amadureçam, assim como a moda e tempo passem. E o mundo, Ah! “O mundo gira, o mundo é uma bola”.



| Convite despretensioso que recebi por e-mail