Porque, meu bem, ninguém é perfeito e a vida é assim

Por Clarissa Dutra


...Concordo plenamente. Todos nós somos seres propícios a escolhas que nem sempre são as mais corretas ou acertadas. Gosto, por exemplo, não se discute. Pode ser perfeito pra mim ou piegas pra você, vice versa. Mas quem dita, meudeusdocéu, o que é a atitude mais correta, o gosto mais acertado? A imperfeição pode ser encarada com criatividade, ousadia, rebeldia, é até sexy – eu acho. Ou não? Não ser perfeito pode ser uma falha!? Não ter o cabelo, o corpo, o namorado(a), o sorriso, a bunda, o carro etc etc etc - mais bonito, é antiquado! A moda é ser bom(a) o tempo todo, toda hora. Perfeição está ligada à estética, assim como o queijo a goiabada e entra tudo junto no mesmo bolo da inteligência e da ascensão pessoal/profissional (tirando o queijo e a goiabada, tá?). Mas calmaê!? Já que não vou falar de política, futebol ou mulher/homem, e pra mim, não vale a pena ficar ditando o que é (im)perfeição ou não,vou falar do BREGA!

Confesso que, abre parênteses, dó ré mi fá só lá si dó não faz diferença alguma e tenor, soprano, falsete, agudo e grave só existem em orquestras, fecha parênteses. Sei também, que no mínimo, é preciso gostar muito de MÚSICA pra se meter a falar de qualquer estilo. (Pééém! Resposta errada!) O brega, que é meu escolhido dessa semana, não toca nunca/jamais no meu ipod, mas – na linha direta de xangô – fica impregnado na minha cabeça. Eu assobio, sabe como é? Gente, Vinicius e Cartola que são minhas paixões não me fazem assobiar. Trato-os com divindade, são intocáveis. Já o brega... Ah! O brega... É pra você pegar, jogar na parede e abusar até a última gota. (Me entendam bem).

Eu poderia começar a falar do começo: Revolução Industrial, industrialização da cultura, arte como mercadoria, cultura de massa, cultura erudita e mimimi. Mas, como embasamentos teóricos costumam ser chatos e pedantes, pularei essa parte e vou logo pra parte boa: a bagaceira. É que, de repente, eu me vi dançando e cantando loucamente. Então, eis que surgem os seguintes questionamentos: o que está acontecendo? Por que o brega está cada vez mais presente no nosso cotidiano e como ele conseguiu sair da margem e ganhar o status de cult? Pois bem, foi vendo um monte de jovens pertencentes às classes A e B no meio de shows de Kelvis Duran, O Conde e Reginaldo Rossi que eu me vi com questionamentos do tipo: "que coisa, né? Esse povo num botava pra lascar nesse tipo de música antigamente?".

Analisando melhor (sem tentar entender), esse fenômeno sociocultural que arrasta esse “novo” público, de uma maneira ou de outra, ME INCLUI. Comoassim? Ééé... Se assobio é porque já impregnou. E se impregnou, bom ou não, é porque algo aí fez a diferença. (O meu diabinho no ombro esquerdo falou que não tem nada haver o que estou dizendo aqui. Que, de fato, eu não gosto de brega e sim, que apenas me influencio pela repetição aleatória e pelo modismo me inserir no contexto social).Tanto faz, tanto faz.

A verdade é que o brega faz parte de mim, de alguma forma, e é ridículo não reconhecê-lo como parte da cultura no qual estou inserida. Se não toca no meu ipod, toca na rádio que vem lá da cozinha, do vizinho do lado, da rua. Toca nas baladas que vou, nas conversas e depois de duas ou três (ou 10 cervejas) já toma conta das minhas pernas e braços e cintura completamente. Há uns quinze dias atrás, por exemplo, disse aos meus pais que estava indo ver um show da Fernanda Takai na Torre Malakoff e, na verdade, estava descendo até o chão, chão chão chão no Motel Sunshine, com a banda Faringes da Paixão! (Ok, eu poderia ter abstraído essa informação). Mas o que estou querendo dizer não é que enganei meus pais ou que Fernanda Takai me dá credibilidade moral, mas que EU ESTAVA ME SUBMETENDO a ir onde Judas perdeu as botas, pra d-a-n-ç-a-r (com todas as letras, porque só foi o que fiz por lá!), o brega. Esse estilo musical que não me dá tesão nas letras, que sua melodia é inteiramente repetitiva, que acho “baixo” e totalmente desnecessário na minha vida. Contraditório, não?

De alguma forma, eu estava (com todo meu amor por Cartola, o homem mais gentil do mundo – diga-se de passagem) envolvida com “Rapariga é você, mal amada, não seja boba, ele não quer te ter...". Sem falar das pérolas românticas: “Se eu tivesse a lua, eu a daria pra você, mas como não tenho nada, eu lhe ofereço um Passe C". E olhe que não entrei na área erótica, porque essa, simplesmente nem pra ri me serve. Brega é pra você se valorizar!? Entrar na academia, malhar, malhar, malhar e não tá nem ai pro resto do mundo!? É o que faremos, então. Por mais subjetivo e contraditório que isso possa parecer.

Confesso que se o Antônio Houaiss conhecesse Vício Louco ou Dejavu – ele mudaria de conceito: BREGA (adj. 1. que o quem não tem finura de maneiras; cafona. 2. de mau gosto, sem refinamento, segundo o ponto de vista de quem o julga 3.de qualidade inferior | Dicionário Houaiss da língua portuguesa). Porque o brega saiu da periferia para se tornar popular entre os jovens de classe média, que antes discriminado e encarado como pejorativo, tornou-se “engraçado” - audível porque é música pra “tirar onda”. Totalmente inserido no nosso contexto social, cotidiano e é atualizadíssimo!

As melodias fortes, letras que falam sobre traição, casamento, desilusões e declarações amorosas, geralmente são levados pro lado humorístico, satirizando o cotidiano ou elevando o duplo-sentido na potência máxima, mas ainda sim é considerado: chic! O brega é pop, é tecno (?) – acredite, já há ramificações inseridas na música eletrônica. E aonde vai parar? Não sei. O ritmo já está inserido na cultura popular dos pernambucanos – é só observar que o brega não toca (apenas) em botequins ou casas “noturnas” em periferias, mas também em festas como I Love cafusú, Sem Loção, Amizade Colorida e lá vão mais outras tantas, produzidas por gente alternativa e descolada, freqüentadas até por boyzinhos e patricinhas – que não estão nem aí pra saber de onde veio ou aonde vai parar.

Se é possível misturar as classes sociais, independente do nível intelectual ou financeiro, e todos convivem em harmonia – deixa rolar o som. O brega é pra conquistar e todo mundo se divertir. E eu, pseudo-intelectualizada, inserida nessa esclerose do poder, de consumo, submergida nessa catarse social e falsa consciência estética, continuo sem acreditar que gosto não se discute (!?). Esperando, porém, acima de tudo, que a gente e a música amadureçam, assim como a moda e tempo passem. E o mundo, Ah! “O mundo gira, o mundo é uma bola”.



| Convite despretensioso que recebi por e-mail

Dispense preconceitos, o novo cd de Otto vai bem aos ouvidos.


Com inspiração no texto “A Metamorfose”, de Franz Kafka, o ex-mangueboy lança um álbum intenso e de qualidade.

Por Andreane Carvalho

Após seis anos de espera, eis que os fãs de Otto podem, finalmente, desfrutar de uma nova produção autoral. “Certa manhã acordei de sonhos intranquilos” é o nome do recém-lançado 7º álbum do artista, que também traz a essência do batuque futurista e brota dos mangues recifenses, como os anteriores. O CD foi co-produzido por Pupilo (batera da Nação Zumbi), contém dez faixas e está recheado de participações especiais, tais como Catatau (líder da banda Cidadão Instigado), Céu, na faixa “O Leite”, Julieta Venegas, nas faixas “Lágrimas Negras” e “Saudade”, além de Dengue (baixista da Nação Zumbi) e Lirinha (líder da banda Cordel do Fogo Encantado).

O último disco, “Sem Gravidade” (2003), deixando de lado a gravação do MTV Apresenta (2005), não chega nem aos pés do atual trabalho. Aos que acham que Otto tem uma péssima dicção e não canta nada, sugiro que comecem a abrir uma exceção. O ex-mangueboy, pela primeira vez, consegue abortar um material de qualidade, com música de letras poéticas e que, principalmente, fazem sentido, alinhadas a bons arranjos de cordas.

“Certa manhã acordei de sonhos intranquilos” fala de amor, não aquele obsessivo, mas algo mais humano e fraterno. A fraternidade, por exemplo, aparece na música brega “Naquela mesa”, regravação de Sérgio Bittencourt. Com a base constituída por um som cafona de teclado, a letra narra as lembranças do filho sobre um pai ausente. No estilo de cantar, Otto traz à memória artistas como Benito di Paula, Luiz Ayrão e Agepê. Um brega de luxo, como os de antigamente.

Os batuques de origem manguebeat aparecem em “Janaína”, uma letra em devoção a Iemanjá. A faixa “Meu mundo”, com participação de Lirinha, também possui batidas eletrônicas típicas da ex-banda Chico Science e Nação Zumbi.

Depois de "Lágrimas Negras", a composição musical começa a complicar. É o caso da música "Agora sim", onde ouvimos "Agora sim o saci, agora são dois irmão, agora posso correr, agora preste atenção". Será uma ode ao saci pererê? Bom, fica a questão. Já a desafinada acontece em “Filha”, quando o cantor parece não ter encontrado a nota adequada para a sua voz.

Considerando que o álbum foi gravado em um esquema de independência, sem a mão de uma gravadora e em conjunto com o Garage Band - programa que emula recursos de gravação e mixagem de um estúdio - Otto consegue realizar um trabalho autoral de qualidade e intenso. Na capa, o cantor parece fazer uma relação do mangue com os possíveis sonhos intranquilos. O título é uma transcrição da frase que abre o texto “A Metamorfose”, do escritor de ficção Franz Kafka (1883-1924): “Quando certa manhã Gregor acordou de sonhos intranqüilos, encontrou-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso”. Resta saber em que momento e qual foi a experiência que Otto passou para se identificar com esse verso tão profundo.

A vulgaridade da solteirice

Falta glamour e identidade nas composições da Mulher Melancia

Por Danielle de Moraes


Esperava um texto sobre a nova banda de reggae do momento ou alguma referência musical um pouco mais cult? Gostaria de ler sobre algum artista que anda preservando a nossa pernambucanidade e inserindo ritmos locais em suas composições? Pois é, para a sua surpresa, não é nada disso a minha fonte de inspiração desta semana.
Tédio. Essa é a palavra que melhor define os nossos domingos. Ainda não sei se sentimos isso porque é um dia demasiadamente tranquilo ou se o tornaram melancólico porque é o que antecede o pior dia da semana: a segunda-feira. É na segunda que retornamos à rotina, voltamos a olhar insistentemente para o relógio e cronometrar os nossos passos, nos submetemos às ordens dos chefes e às vezes não temos condições de dar a atenção que gostaríamos nem mesmo à quem divide o mesmo teto com a gente. A programação da televisão também acompanha o infeliz domingo. Chega a ser uma tortura ter que decidir entre assistir ao Gugu, Eliana ou Faustão. E foi num dia desses de domingo que descobri que a saga das mulheres fruta estava indo além da dança.
Mulher Melancia, Jaca, Melão, Moranguinho. Elas tornara-se celebridades pela desenvoltura na hora de dançar o pancadão carioca. Os bailes funk não seriam os mesmos sem as performances das mulheres fruta. Sem as bundas e peitos delas, provavelmente o pancadão não atraísse tantos marmanjos. Não foi surpresa quando descobri que Andressa Soares, a Mulher Melancia, havia faturado alguns reais após aceitar ao convite para posar nua na Playboy. Ela – ou a sua bunda – ficou conhecida por dançar o Créu até a velocidade 5. O motivo da minha surpresa foi o fato da Melancia não se contentar em ser apenas mais uma dançarina gostosinha. Ela lançou-se como muito mais do que isso: a cantora gostosinha. Não satisfeita com a agilidade da velocidade 5 do Créu, apresentou o hit Velocidade 6. Mas a composição que mais chamou a minha atenção foi a música “Solteira sim, sozinha nunca”. O ápice da independência da mulher, para Melancia, é chegar ao baile, beijar quem quiser e rebolar, mas rebolar muito, até não poder mais. Como ela diz na letra, “é melhor tu ser solteira do que uma chifruda”.
Sabemos que após tantas decepções algumas mulheres optam por passar um tempo sozinhas, sem namorado. Cansam só em pensar em ter que dar satisfação novamente à alguém, não querem se acostumar e desacostumar com a presença de outro homem em suas vidas, não têm paciência para dividir suas intimidades, planos e sonhos com mais um cara que não sabe o que quer. Esse momento de redescoberta pelo qual as mulheres – e os homens – passam após o fim de um relacionamento é saudável. É natural querer um tempo para estar novamente bem consigo. Posteriormente, quem sabe, deixe se envolver por uma outra figura.
Farras durante a madrugada, cervejas e drinks com outros amigos, saídas mais constantes e um pouco menos de controle nessas ocasiões são normais e necessárias. Imagine o tempo que um casal passa cultivando – ou não – a fidelidade. Quantas vezes deixa de ir para a festa louca daquela amiga solteira que conhece vários caras e que o seu namorado não vai muito com a cara? Quanto tempo deixou de visitar o seu amigo que tanto te faz bem porque os poucos momentos que tinha livre reservava para sustentar o seu relacionamento? Renúncias. Elas precisam existir quando se gosta de verdade. Mas quando as diferenças, indiferenças ou incompreensão tornam-se mais fortes do que o amor que antes havia – ou deveria haver -, é hora de resgatar essas coisas que você acaba deixando para lá – às vezes até inconscientemente.
O problema de “Solteira sim, sozinha nunca” não está no fato da Mulher Melancia cantar este momento, maravilhoso, por sinal. A forma de cantar isso é que entristece quem analisa o melodia com um pouco mais de profundidade. A forma de brindar a solteirice é rebolando a bunda e dando um chute da bunda dos homens que querem alguma coisa mais séria?
Temos realmente que escolher com quem queremos nos envolver, mas será que temos que mudar quando enjoar de alguém? Enjoar de quê? Dos braços musculosos, barriga tanquinho ou pernas torneadas? Acho que a infelicidade da Mulher Melancia está aí. Andou se envolvendo muito superficialmente, da forma mais fútil que possa existir. E se ser solteira é uma meta, Melancia, desse jeito, com todos esses valores que anda pregando, você vai sempre alcançá-la. Vai beijar milhões, rebolar até não aguentar mais. Agora, se vai conseguir amar, já não tenho certeza.
A voz da Mulher Melancia também não é muito agradável. É, digamos, até um pouco irritante. Ela também não carrega o glamour que deveria acompanhar uma poderosa funkeira. Umas aulinhas com a Gaiola das Popozudas até que cairiam bem. As turbinadas da banda estão acostumadas em elevar a auto-estima das funkeiras com as músicas “Fiel é o caralho”, “Otário pra bancar” e “Late que eu tou passando”. Inclusive, também não as recomendo para as mais românticas, mas ajudam a animar uma festinha.
O som do batidão que está por trás da letra medíocre de “Solteira sim, sozinha nunca” ainda ajuda a situá-la no universo dos funkeiros, já que preserva a sonoridade do estilo musical. Era preciso de algo, além das saias curtíssimas e do corpo malhado da popozuda, para situar as pessoas e convencê-las de que a Garota Melancia havia transformado-se na promessa do funk.



Andressa Soares, a Mulher Melancia, ficou conhecida no universo funk com as performances do Créu

Britney Spears – Circus Tour 2009



Música ao vivo pra quê?

Por Otacilio Gaudencio

Chego no local do show: EnergySolutions Arena, o maior estádio do estado(Utah). Eu morava naquela área da cidade (Salt Lake City), a apenas dois quarteirões dali e NUNCA tinha visto aquele lugar daquele jeito. Muita gente, muitos carros, trânsito congestionado. Vale enfatizar que o número de limusines no local era proporcional ao de Celtas na cidade do Recife. Grupos de amigos, com garrafas de champanhe saiam delas babados e gritando.

Após uma breve revista, entro no estádio. Lotado. Eu estava do lado oposto da entrada pro meu camarote. No caminho, que é rodeado de lojas de fastfood, vários quiosques de venda de pipoca, algodão doce e suvenires, todos estampados com o nome da cantora e com o emblema da turnê, que é o mesmo do último Cd dela, o Circus. Misturados a eles, raros quiosques de cervejas draft (leia-se Chope, única bebida alcoólica permitida em estádios americanos), que eram os recordistas em fila.

Mas o que mais chamava atenção eram as pessoas. Pessoas de todas as idades, de crianças de colo a idosos, de todas as cores, gêneros, classes sociais e tudo que possa ser classificável. Muitas garotas e muitas delas - até alguns rapazes também - vestidos de alguma maneira a aludir Britney Spears. Só no meu caminho eu vi todas as variações de Britney Spears no clipe de Toxic, Baby One More Time, Womanizer e várias outras que não consegui identificar de onde vinham. Sem contar os homens, que em grupos vestiam camisas com o nome Womanizer (que significa mulherengo, ou pegador, já que o termo é meio que invariável) ou alguma frase fazendo alusão a alguma música da cantora.

Ao entrar no meu camarote, me deparo com um palco em formato de arena, circundado pelo público, como o picadeiro de um circo. E era essa a intenção. Um telão gigantesco circundava o “teto” do palco como uma aréola. Nele o emblema de uma grande rede de telefonia celular americana, que por sinal estampava toda e qualquer coisa que se relacionasse ao show.

Próximo a começar o show, um grupo de palhaços começou a montar a estrutura do palco, que se tornava uma espécie de picadeiro, maior do que antes com duas “abas” nas laterais. Terminada a apresentação, começaram os números circenses. Todos os tradicionais de circo, como engolir fogo, malabarismo, com ênfase especial a um com uma espécie de cubo giratório que nunca tinha visto. Todos acontecendo em lados opostos aos de onde o palco esta sendo montado. Ótima maneira de distrair o público para meia hora de preparação de palco.

Nesse momento, percebo que não estou apenas a uma distancia privilegiada do palco, estou no melhor lado dele. Um grupo de aproximadamente 30 pessoas começa a se posicionar entre o palco e os sofás dos VIPS. Ao meio de uma parafernália absurda. Eles iriam roubar minha atenção em porcentagem significativa show...

Terminada a montagem, eis que as luzes se apagam e o telão surge novamente em nossas frentes, dessa vez, escondendo todo o palco. Nele, está um homem afeminado, vestido com uma roupa feminina do século retrasado, com uma musica de circo, cercado por coisas estranhas no picadeiro de um circo. Ninguém menos que o comediante Perez Hilton. Uma imagem no mínimo bizarra. Algo que parecia mais um demônio que propriamente um rei (ou rainha). Após quase cinco minutos de falação e bizarrices, ele pergunta se estávamos prontos para a “orgia”. O som era muito alto, mas eu não tenho dúvida de que muitas criancinhas estariam chorando naquele momento e muitos pais de cabelo em pé. Uma seqüência de vídeos e flashes rápidos da cantora correram no telão. O telão se apaga e a gritaria do púbico aumenta. O fundo de uma música começa. A sensação é de dar arrepios, não pelas bizarrices, e sim pela magnetude do evento.

Ao subir, o telão revela o grupo de dançarinos, fazendo tudo que um circo pede. A iluminação somada ao telão e ao som estridente da música circus. O público inevitavelmente entra em transe. Uma mulher extremamente branca e loira surge causando um estrondo de gritos no estádio, vestida com uma roupa que me lembrou Xuxa nos primórdio dos anos 90. Descendo da parte de cima do estádio. Coincidência? Ou será que elas fizeram um pacto com a mesma pessoa?

Talvez seja por vê-la ao vivo, ou talvez seja o conjunto da produção do show que dão o estase da coisa. A verdade é que tudo ali convergia para o “embasbacamento” de qualquer desavisado. Luzes, imagens, sons, pessoas em movimento, tudo o que pode ser explorado pelo entretenimento estava sendo usado.

E o show começou, depois da introdutória circus, nada melhor do que piece of me para ser a segunda. Afinal, era um pouco disso que todos ali estava tendo (ou ao menos queriam ter). No fundo as duas são grandes críticas: “Isto é um circo e vocês querem um pedaço de mim.”. O que seria bem desenvolvido até o último momento do show.

Saído do alvoroço de abertura, o show seguiu entrando em seu ritmo, sem grandes estupores. Logo veio, Radar e a irritante Gimme more – que na versão tocada ficou menos irritante. O telão sempre fazendo o seu incessante papel de complementar o que talvez faltasse na configuração confusa do palco. E cada musica tinha sua imagem, Gimme more foi escrita japonesa, Radar fotos de pessoas de circo do início do século passado(?!). Uma homenagem, talvez.

Em seguida veio ooh ooh baby e hot as ice, com um número de ilusionismo bem interessante na transição entra as duas. E foi se seguindo ameno o show. Sem grandes estardalhaços, mas mesmo assim empolgante. O público já estava se familiarizando com a cantora.

If U Seek Amy, que naquela semana estava no topo das paradas, não teve uma performance tão empolgante quanto merecia. Em seguida, me against the music conseguiu ficar divertida em uma roupagem à Índia, e lá iam as mãozinhas indianas no telão. E, finalmente, uma música lenta, a depressiva everytime. Nesse momento, a cantora pela primeira vez fez o seu contato com o público.

Uma voz extremamente fina, aparentemente de uma garota de 12 anos, que em poucos pontos se parece com o da cantora cumprimentou a cidade e o público, com o velho clichê que funciona: “I’m so happy to be here tonight”. Boa parte do público se entreolhou desconfiado, mais pela voz do que pela frase. E também foi nesse momento que pela primeira vez, a música parecia, em alguns momentos não ser um playback. Apenas parecia.

E eis que ela some mais uma vez, e o telão desce. O que eu não tinha percebido, ainda, era que a parte “boa moça” do show tinha acabado. O vídeo do que parecia um pré-orgia começou a ser rodado e com a voz de Marlyn Manson cantando sua versão de Sweet dreams, e no final, surge a voz de Britney distorcida (que novidade!) de maneira bem bizarra. Bem, legal. Sinal de que o show acabou para as criancinhas.

Nesse momento tive a minha atenção desviada, novamente, para o grupo de pessoas próximas ao palco. Por mais que eles tocassem, eu não acreditava. Bateristas, guitarristas, baixistas, backingvocals, e vários outros que eu não compreendi a função. Se Britney Spears nítida e obviamente não cantava ao vivo, qual seria o motivo para eles TOCAREM, ao vivo? Fingir? Talvez. Mas eles realmente tocavam, principalmente a bateria, base da musica pop. Na distância em que eu estava ficava claro que o que movimentava lá, saia no som perfeitamente. Fiquei boquiaberto com o sincronismo deles com a música. Não seria mais fácil colocar um cd?

E eis que freakshow abre a segunda metade do show. E Britney surge, dando chicotadas em seus bailarinos, o que parece uma festinha sado-masoquista seguida por get naked. Na mesma linha sensual. E em meio a reboladinhas e gemidos, acontece a melhor parte de todo o show...

Em breathe on me, dois os bailarinos chegam discretamente de cima com uma coreografia e roupas (sado) bem suspeitas. Em touch of my hands eles formam um arco em uma posição que não sei descrever, onde a cantora senta em cima deles. Bem na linha “é-pra-isso-que-os-homens-servem”, deixando o público em estase. Mas o melhor estaria por vir, ao descerem desunidos de onde vieram, um dos dançarinos pendurados, literalmente acocha a cantora e a leva para o alto, até sumirem, isso tudo no ritmo da música. O público entrou em pavorosa. Naquele momento eu pensei que realmente é muito querer que ela cante de verdade fazendo tudo o que faz no palco.

E no resto do show, não houve nada de mais. Do somethin’ seguiu a mesma linha do clipe. I’m a slave 4 u também. Logo em seguida veio a apresentação dos dançarinos, que deram um show aparte, sem a presença de Britney no palco. Logo veio toxic, sem muita graça, e sem nada a ver com o clipe e a já clássica baby one more time. O que me desapontou foi break the Ice, curta de mais.

O telão fecha o palco mais um vez, e uma imagem branca pisca. Um barulho de sirene toma conta do local revelando a batida de womanizer e o público de súbito se aproxima do palco. Eles entenderam o que eu ainda não tinha: aquela era a última música do show. E várias câmeras de segurança começam a fazer piruetas em um efeito bem interessante, como se dissessem “estamos vendo tudo”. E eis que Britney surge vestida de policial (!) para a última performance. Nos segundos finais, todo staff de dançarinos se concentra no meio do palco e uma chuva densa de faíscas e papel picado caem do “céu”. Muito legal de se ver, e empolgante. Simpática, ela agradece e se despede do público. E como um funcionário que nota que já deu a hora de fazer o “clockout”, Britney sai do palco.

Foi isso! Todos tiveram o “pedaço” de Britney e ela não tinha mais nada o que fazer ali. O show foi perfeito, pontual, simétrico, e divertido. E é por isso que ele é bom. Ele é o que um produto daquele tem que ser: perfeito. E é isso que o faz tão artificial. Assim como a cantora.

Musicalmente, ele agregou o melhor que já produzido no nome de Britney Spears, leia-se do quarto disco In the zone passando pelo excepcional blackout, chegando ao que interessa do maduro Circus, e claro, as clássicas. Assim como o melhor em profissionais de iluminação, vídeo, dança e música. E mesmo com temas mais sensuais/sexuais, o show conseguiu não cair em vulgaridade.

Você sai do show com a sensação de que consumiu o produto máximo do melhor que a indústria do entretenimento pode oferece. Sem defeitos e ao vivo. E sente, que mais do que um produto, Britney Spears nada mais é do que uma personagem.

O show só mostra que Britney nada mais é do que o reflexo de toda uma geração, de todas aquelas meninas que estavam ali, de todos e que interpreta o sexo de uma maneira aberta. Ela é a cultura da juventude americana personificada. E não ela, mas sim essa cultura que é o que dominou o mundo. Hoje é Britney, amanha será outra.

Se eu tivesse assistido ao show no Brasil, ou em qualquer outro lugar fora do EUA, sem duvida a experiência não seria tão completa. Por isso, pra que se preocupar com musica ao vivo, playback, quando o que se tem ali é um produto que oferece muito mais do que uma moça cantando. Isso talvez seja o de menos.