Carta para alguém bem perto: um convite à subjetividade

Fernanda Young chega perto do leitor ao optar por linguagem simples

Por Danielle de Moraes

Cartas sempre foram para mim muito mais do que um simples meio de comunicação. Costumo dizer que são uma das mais belas formas de expressão. Pode ser que eu pense isso por gostar de escrever, mas acredito que elas carregam uma carga bem mais profunda de emoções do que qualquer email e são mais tocantes do que muitos telefonemas. Já tinha ouvido falar de Fernanda Young por uma amiga, ela havia lido Vergonha dos Pés, primeiro romance da escritora e elogiado a obra. Foi quando fui tomada por curiosidade e resolvi, há alguns anos, ler Carta para alguém bem perto, obra que já me chamou a atenção pelo titulo.
Young envolve o leitor pela forma simples de abordar temáticas subjetivas e pelo estilo direto de escrever. A linguagem coloquial do livro prende a atenção, é como se estivéssemos participando de uma conversa, tamanha a simplicidade da narrativa.
Entrei na vida, nos sonhos, nas angústias, nos medos, nas frustrações, na solidão de Ariana, personagem principal da história. Ariana é uma mulher de meia idade, casada com um empresário, que precisa administrar a casa, os empregados e a vida da filha, Danielle. Coincidência ou não, o pouco que falei da obra apresenta algumas semelhanças comigo. A filhinha certinha da protagonista tem o meu nome. Ariana não gosta do nome da filha, consequentemente, não gosta do meu nome. Reclama do nome da filha ser Danielle com dois éles. Além disso, sou de 11 de abril. Sou ariana, tenho um pouco daquela mulher. Na verdade, acho que todas temos um pouco dela em alguns momentos. Quem nunca pensou em abandonar velhos hábitos que foram se construindo por obrigação? Quem nunca desejou jogar para o alto algumas conquistas e traçar um outro destino? Quem nunca viveu a angústia de viver de aparência em alguma situação? Quem nunca foi tomado por frustrações por abandonar sonhos antigos? Ariana está, de alguma forma, em todos nós. É por essa identificação que temos prazer em vibrar junto á Ariana, em torcer para ela se realizar, em lamentar cada momento de solidão.
Fernanda não está interessada em ser políticamente correta, não pretende reforçar falsos moralismos e é capaz de chocar os mais conservadores. Ariana, a mãe de família, casada com empresário, mulher que deveria estar acostumada às regras sociais sente-se sozinha, apesar da sempre haver algum empregado em sua casa. Ela, uma mulher séria, deveria ser invadida pela vontade de fumar um baseado? Não? E quem determina as vontades humanas? A idade e as responsabilidades guiariam esses desejos? Ariana não só fuma maconha, como provoca o marido ao alimentar aventura carnal com uma amiga que passa uma temporada em sua casa.
Ariana era para ser uma dona de casa tradicional, não precisa trabalhar porque o marido não deixa faltar nada. Mas ela não se satisfaz, quer muito mais. Por que ela havia adormecido a paixão pelo balé? Também estaria velha demais para isso? Ariana não suporta ser apenas a mãe de Danielle, a mulher do empresário renomado, a patroa. Ariana quer viver bem mais intensamente, precisa de uma vida mais apaixonada, dias mais emocionantes, amigos por perto, gente que goste de dividir suas vidas com ela. É quando decide viajar com um velho amigo concertista e portador do vírus HIV pela Riviera Francesa. Ariana tem a chance de ficar longe de tudo, rever seus dias, pensar sobre como a sua vida havia se construído e como seria o seu futuro. Era tudo o que ela precisava: um tempo do marido, alguns momentos longe da filha. Talvez ela precisasse mesmo sentir falta da mãe, as diferenças das duas eram gritantes, mas Danielle poderia aprender a reconhecer a importância de Ariana. Além disso, ela estava com o amigo, aquela pessoa tão amada que estava passando por momentos tão angustiantes. Os dois queriam a morte longe, precisavam de mais alegria, uma vida mais intensa, menos preocupada com o futuro, bem mais interessada em um presente mais feliz .
Encontramos, nas 382 páginas do livro, alguns diálogos de Ariana com as pessoas que participam de sua vida que nos ajudam a desvendar ainda mais a personalidade da personagem. Não são tão longos, mas necessários. Dão ritmo à narrativa, que permanece constante, embora não seja estagnado. Queremos descobrir os próximos passos da personagem, como ela vai enfrentar algumas situações.
Se Young vai ser sucesso dentro do universo masculino, com as vendas da Playboy deste mês, não sabemos, mas o estilo envolvente de escrever já conquistou muitas pessoas – inclusive a Danielle com dois éles, a ariana que não tem uma mãe chamada Ariana, mas guarda um pouco de cada personagem intenso criado pela escritora dentro de si.



Com narrativa leve, Fernanda Young chama a atenção do leitor em Carta para alguém bem perto

Um comentário:

Jornalismo opinativo disse...

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